Manguito rotador é nome dado ao conjunto de quatro músculos, todos eles com origem na escápula e inserção na cabeça do úmero na região do ombro. Os músculos que o compõem são: Supra-espinhal, Infra-espinhal, Redondo menor e Subescapular.
As principais funções do manguito rotador são auxiliar nos movimentos do ombro (elevação e rotações), assim como estabilizar a articulação, mantendo o ombro bem posicionado durante os movimentos.
Alterações no equilíbrio das forças musculares desse conjunto causam mudanças biomecânicas no ombro, afetando os movimentos e causando dor, o que leva muitas pessoas a procurar ajuda médica.
A lesão do manguito rotador é o rompimento de um ou mais tendões que compõe seu conjunto, sendo mais frequente no tendão do músculo supra-espinhal, seguido pela associação das lesões do supra e infra-espinhal e mais raramente no tendão do subescapular.
Essas lesões são uma das principais causas de dor e incapacidade funcional do ombro, e causas frequente de cirurgia ortopédica nos membros superiores.
A principal queixa apresentada pelos pacientes é a dor na região lateral do braço e ombro, podendo irradiar para a parte de trás do ombro (na escápula) e cervical.
A dor acontece mais no período noturno ao deitar e durante os movimentos de elevação e sustentação do braço. Perda progressiva dos movimentos por perda de força, e dificuldade para elevação do ombro também são sintomas relatados, porém nem sempre estão presentes. Na maioria dos casos os pacientes não se recordam de eventos traumáticos que possam ter causado os sintomas.
Em sua maioria, as lesões do manguito rotador têm características degenerativas, provavelmente decorrente do processo de envelhecimento natural. Essa característica é confirmada na medida que lesões são mais frequentes em pacientes com mais de 55 anos, acometendo aproximadamente 30% da população acima de 60 anos e 62% dos indivíduos com mais de 80 anos.
Para entender melhor o processo de desgaste dos tendões do manguito, é importante o conhecimento da anatomia. Os tendões estão localizados no espaço subacromial, delimitado na parte superior pelo acrômio (processo ósseo da escápula), e na parte inferior pela cabeça do úmero (osso do braço).
Com isso, movimentos de elevação do ombro, alterações anatômicas que diminuem esse espaço, assim como o desequilíbrio muscular, podem predispor a traumatismo repetitivo nos tendões, causando tendinites crônicas, que no longo prazo podem levar a rompimentos dos tendões. Esse processo de traumatismo no espaço subacromial chamamos de Síndrome do Impacto.
Outros fatores de risco relacionados com o surgimento das lesões são as alterações vasculares nos tendões (fumantes) e fatores genéticos. Com menor frequência, as lesões podem ser ocasionadas por traumas, como quedas ao solo ou lesão traumáticas durante práticas esportivas.
Como podemos ver são diversas as causas para o surgimento das lesões do manguito, e muitas vezes essas causas estão associadas umas as outras.
A suspeita clínica, através de uma história detalhada e exame físico minucioso, é o primeiro passo para o diagnóstico. Exames de imagem são importantes para a confirmação e avaliação da extensão e gravidade das lesões, assim como descartar outros diagnósticos diferenciais.
Radiografias simples avaliam achados indiretos de lesões, como sinais de impacto subacromial, incongruência articular e sinais de artropatia degenerativa (desgaste da cartilagem com artrose). O ultrassom pode diagnosticar adequadamente as lesões, porém necessita de médico experiente para sua realização. A ressonância magnética é o exame de escolha para o diagnóstico, apresentando informações importantes para o tratamento adequado e individualizado, como extensão da lesão, atrofia muscular e degeneração gordurosa.
(A) Radiografia do ombro com sinais indiretos de lesão do manguito.
Linha vermelha – diminuição do espaço articular por elevação da cabeça do úmero
Curvas amarelas – Incongruência articular
Curvas verdes – osteófito por lesão de cartilagem e consequente artrose
(B) Seta indicando a lesão do manguito na ressonância magnética.
As lesões podem ser classificadas em parciais ou completas (transfixantes), e acometer parte de um dos tendões, um tendão inteiro ou mais de um tendão. Podem ser classificadas também de acordo com a extensão em pequenas, médias, grande ou maciças, dependendo do grau de retração dos tendões em relação a sua posição original. Outra avaliação importante para a definição da gravidade da lesão é a análise do grau de atrofia e degeneração gordurosa dos músculos do manguito. Pacientes com maior atrofia e degeneração gordurosa apresentam piores resultados para o tratamento cirúrgico.
(A) Imagem demonstrando a progressão da extensão das lesões.
Imagem de ressonância magnética demonstrando. (A) Músculo normal. (B) Atrofia leve a moderada (C) Atrofia avançada com degeneração gordurosa da musculatura.
As lesões do manguito rotador podem sim aumentar com o tempo. Estudos demonstraram que até 50% das lesões aumentam com até 5 anos do diagnóstico. O risco de aumento é maior nos pacientes com lesões maiores, naqueles que apresentam sintomas como dor e déficit funcional, e nos mais jovens (< 60 anos).
Imagens de ressonância com a progressão da extensão lesão da foto (A) para a (B).
As lesões do manguito não cicatrizam sozinhas, porém nem todos os pacientes vão necessitar de tratamento cirúrgico. O tratamento clínico, com orientações sobre cuidados diários, uso de medicamentos e fisioterapia, é o tratamento inicial de escolha na maioria dos casos sintomáticos. A gravidade da lesão nem sempre significa maior disfunção ou dor, o que permite o tratamento conservador até para os pacientes com lesão mais graves.
Aqueles pacientes que não apresentam melhora com o tratamento conservador por 3 a 6 meses, e aqueles com lesões traumáticas podem se beneficiar do tratamento cirúrgico.
Estudos documentaram bons resultados com o tratamento cirúrgico das lesões degenerativas do manguito rotador.
Quando considerado o tratamento cirúrgico devemos ter em mente que a idade do paciente, o tamanho da lesão, assim como o grau de atrofia e degeneração gordurosa interferem no potencial de cicatrização, com isso o tempo pode ser essencial para o resultado final do tratamento.
As lesões do manguito rotador podem ser reparadas cirurgicamente através de artroscopia ou por reparo aberto com mini acesso. A artroscopia é um método menos invasivo que proporciona avaliação detalhada da articulação, através de artroscópio (câmera) de alta resolução. Diversas técnicas de reparo estão disponíveis e a melhor técnica para cada tipo e gravidade de lesão deve ser devidamente discutida e apresentada por um especialista em cirurgia de ombro.
A reabilitação pós reparação cirúrgica do manguito rotador deve ser cuidadosamente orientada. Respeitar o tempo de imobilização de 4 a 6 semanas pós-operatórias irá proteger o reparo dos tendões enquanto cicatrizam. Após esse período, a fisioterapia para readquirir os movimentos através de exercícios de alongamentos, e finalmente o fortalecimento, são etapas que devem ser transcorridas no tempo correto, e o cirurgião deverá apresentá-las de forma clara, diminuindo riscos inerentes ao tratamento, como rigidez pós-operatória (limitação dos movimentos) do ombro e re-rupturas dos tendões.
Apresentamos na seção de pós-operatório as etapas de maneira simplificada onde orientamos nossos pacientes como passar sem sustos por essa recuperação que deve durar ao redor de seis meses, quando provavelmente o paciente poderá retornar às suas atividades habituais e esportivas. Lembrando que os prazos de recuperação variam de acordo com as características de cada paciente e da gravidade de lesão, assim como a habilidade cirúrgica do cirurgião.
É bem estabelecido que as lesões degenerativas, maiores e com maior tempo de evolução, tendem a apresentar maior atrofia e degeneração gordurosa da musculatura, o que possivelmente irá interferir na cicatrização dos tendões tratamentos cirurgicamente. Para as lesões maciças sintomáticas, que não são passíveis de reparo cirúrgico, as transferências de tendão podem ser uma alternativa de tratamento.
Classicamente a transferência do tendão do músculo grande dorsal é uma opção para as lesões irreparáveis dos tendões do supra e infra-espinhais. Já a transferência do peitoral maior pode ser indicada para as lesões irreparáveis do subescapular. Porém esse tipo de tratamento requer indicação precisa e avaliação individualizada.
Para aqueles pacientes sintomáticos, com lesão graves, irreparáveis, negligenciadas, e que evoluíram com artropatia do manguito rotador com ascensão da cabeça umeral, o tratamento de escolha é a realização de artroplastia reversa do ombro. Esse tipo de tratamento, em casos bem selecionados, permite melhora do quadro de dor e melhora dos movimentos do ombro.
Figura e radiografia com prótese reversa de ombro para o tratamento de artropatia do manguito rotador.
A melhor maneira de prevenir as tendinopatias do manguito rotador é levar vida saudável, com exercícios físicos regulares e bem orientados, cuidados com atividades habituais de trabalho, evitando sobrecarga e movimentos repetitivos com posturas inadequadas. No caso de esportistas que utilizam os membros superiores, como os tenistas, golfistas, nadadores e atletas de arremesso, onde o impacto nas articulações é constante, é fundamental o treinamento de base, com reforço muscular e adequação dos movimentos esportivos, diminuindo danos aos tendões. Um médico especialista em ombro e cotovelo poderá te orientar.
Referências
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6 – https://www.orthopedia.com/shoulder
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